sexta-feira, 15 de abril de 2011

CRESCER


Hoje acordei antes que a própria manhã. Não que o sono tivesse acabado, era mais um misto de ansiedade com vontade de “fazer acontecer” mais depressa.

Mesmo não mais dormindo, esperei o despertador dizer-me a hora de levantar e buscar o pão para o café da manhã. Em frente à padaria tem uma loja de aluguel de festas infantis. Ela está ali faz um bom tempo, um ano, talvez mais, mas hoje um enfeite daqueles de por na mesa do bolo chamou-me a atenção: a Sininho, sentada numa flor, olhava para mim e parecia seguir-me com os olhos enquanto passava na frente da loja.

Quando a gente é criança, tem um momento, que fica louco para crescer logo, tornar-se adulto, dar conta de sua própria vida, sair da casa dos pais, fazer o que quiser. Nessa época a gente acha que tornar-se adulto é ter o emprego dos sonhos, ganhar muito dinheiro, dirigir um carrão, tomar sorvete e comer chocolate todos os dias e passar horas na frente da TV vendo filminho, desenho ou só jogando game.

Lembro-me que sonhava em ser executiva, trabalhar numa multinacional, atender inúmeros telefonemas, ler diversos livros, conversar (e pensar) em vários idiomas, usar saltos astronômicos e roupas elegantes. Brincava com minhas amigas de escritório e pegar “emprestada” (leia-se: escondido) a calculadora e a máquina de escrever do meu irmão eram o ápice da diversão. 

Sonhei também em ser policial e tornar-me professora. Mas esses sonhos não valem, porque foram induzidos pelas profissões de meus pais. Mas era divertido brincar de escolinha e ensinar as bonecas o B-A-BA ou correr atrás dos meninos na rua, prendê-los com algemas imaginárias em celas cercadas com uma vara ou um cabo de vassoura.

Também fui exploradora na época que estavam construindo a galeria de águas fluviais na minha rua. Nós entrávamos dentro dela na beirada do rio e seguíamos rua acima (ou abaixo se pensarmos que estávamos dentro da galeria e debaixo da rua) e íamos sair em outro bairro, todos sujos de lama e arranhados.

Era maravilhoso tudo aquilo e ainda: cantar na caçamba de caminhões ou representar no teatro do dia das mães como se fosse artista famosa; escrever as redações da escola e vir-me autografando meus próprios livros.

Tudo era projeção para o futuro. Era ensaio para uma vida que queríamos viver quando crescêssemos. Era nossa ânsia, nosso desejo mais latente, nosso sonho fosse dormindo ou acordado: tornar-nos adultos.

Sábio foi Peter Pan, que compreendeu a dinâmica da vida bem antes e sonhou, desejou, buscou e conseguiu nunca crescer. Acho que era isso que a Sininho pensava ao olhar-me hoje pela manhã quando fui buscar pão: “Ela cresceu”...

terça-feira, 5 de abril de 2011

A SAGA DA PASTA

Dia desses perdi a palmilha do meu tênis dentro do meu carro. Revirei tudo, levantei livros, olhei debaixo dos bancos, recolhi objetos pelo chão e nada dela. Quando reclamava a uma amiga ela disse-me que provavelmente algum duende havia escondido a palmilha do meu tênis só para divertir-se comigo e quando ele cansasse da brincadeira eu a encontraria.


Sem mais nem menos, alguns dias depois, ela (a palmilha do tênis) estava jogada ao lado da alavanca do freio de mão, entre os dois bancos da frente. Bem ali, onde eu havia olhado uma dezena e meia de vezes. Os duendes haviam cansado da brincadeira.

A chave do carro, já não tenho mais conta das vezes que perdi. Cogitei até a possibilidade de colocar um alarme nela para que apitasse quando eu acionasse um botão ou batesse palmas, mas minha filha avisou-me que essa tecnologia ainda não chegou a nossa cidade e que eu me contentasse em procurá-la até encontrar e que ligasse para meu celular todas as vezes que ele sumisse, rezando para que eu não tivesse colocado-o no modo silencioso.

Nesta semana sumiu uma pasta da minha sala. Uma dessas pastas simples de trilho, feita de papelão vermelho. Uma pasta que não custa mais que R$ 1,00 em qualquer papelaria. Sumiu. Simplesmente desintegrou-se.

Demos por falta dela dois dias depois. Procura daqui, revira dali. Pergunta um, pergunta outro. Olha dentro de um armário, procura na mesa vizinha. Até o lixeiro vasculhamos. Rodamos todo o prédio em busca da bendita, mas ela realmente parecia ter criado pernas ou, na teoria da minha amiga, os duendes estavam dispostos a brincar novamente.

Lembrando-me do episódio da palmilha do meu tênis resolvi revirar meu carro. Quem sabe os duendes haviam levando a pasta e colocado ao lado da alavanca do freio, entre os dois bancos da frente... mas, em meio à confusão e profusão de livros, papeis, sapatos, blusas, not book, bola, bala e tudo mais que reside no meu carro, não encontrei a pasta.

Passei um fim de semana inteiro preocupada com aquela boa e velha pasta de trilho, feita de papelão vermelho. Coitada, tão sozinha e indefesa; tanto que me ajudou guardando papeis, lista de presenças, justificativas de ausências, e-mail’s, telefones... e agora perdida, raptada pelos sádicos duendes.

Segunda-feira e um mutirão foi feito. Toda a Secretaria uniu-se em prol de descobrir o paradeiro da bendita pasta de trilho, feita de papelão vermelho. Todos juntos e unidos, Salve-Rainhas foram rezadas, dedos apontados em riste, olhos marejados em lágrimas, telefonemas dados e, finalmente, eis que os duendes cansaram-se da brincadeira e abandonaram-na em uma escola próxima (onde na segunda-feira da semana passada eu havia dado planejamento aos professores) e a pasta foi trazida de volta para minha mesa (lugar aliás de onde ela não sairá mais tão cedo) sã e salva, recheada de papeis, lista de presenças, justificativas de ausências, e-mail’s, telefones...