terça-feira, 30 de novembro de 2010

DIÁRIO DO MESTRADO - MÓDULO II - FIM DE SEMANA

Sonhos realizados são difíceis de descrever, e os que estão em processo de realização ficam ainda mais complicados de serem explicitados.



Estou assim, meio que em estado de êxtase. Feliz, entusiasmada e ciente de que ainda tenho um longo, longo caminho a percorrer, mas estou disposta a todos os sacrifícios que esta jornada me cobrará, pois sei que bem a 20 metros do arco-íris, o ar tem cheiro doce.


Mais que aprendizados acadêmicos (e que profusão deles), experienciei também aprendizados de vida; ultrapassei barreiras que imaginei intransponíveis; descobri que dentro de mim existe mais força do que supunha; iniciei o despertar de uma alma adormecida, que pouco a pouco vai redescobrindo-se, reencontrando-se, felicitando-se por si mesma e consigo mesma.


Neste fim de semana recobrei um pouco mais da minha fé no outro. Percebi que mesmo que tenham matado em mim a confiança no meu semelhante, ainda existem alguns que são dignos dela e que todo seu esforço deve ser levado em consideração.


Conheci gente, várias gentes: distintas, únicas, incomparáveis. Descobri que o conhecimento não muda mesmo que mudemos de continente, e que não há nenhuma necessidade de sabermos tudo, nem mesmo mais do que seja necessário para nossa sobrevivência, porque sempre haverá alguém que está disposto a compartilhar conosco aquilo que levou uma vida para descobrir, aquilo que aprendeu devorando livros e livros, aquilo que conheceu em suas andanças pelo mundo, aquilo que absorveu das observações cotidianas e ainda aquilo que lhe sobreveio numa noite sem sono debruçado sobre escritos alheios.


É só o início, é o meu início. O caminho é longo, a estrada nem sempre tranqüila. Haverá percalços ao longo da minha jornada, sei disso, mas não estou me incomodando muito com isso não, estou apenas interessada em trilhar por esta passagem e ver o que me espera lá na frente, logo depois da curva.

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

DIÁRIO DO MESTRADO - MÓDULO II - QUINTA-FEIRA

Esperei tanto este dia chegar, que nem vi a semana passar. Quinta-feira! Primeiro dia! Para sair de casa e chegar lá não foi fácil (mas afinal o que é?), discussões, correria, coisas de última hora para providenciar, coisas que a última hora não permite providenciar. Fui e voltei debaixo de chuva. Greve de ônibus, trânsito engarrafado.


Na sala de aula um monte de rostos desconhecidos. Nas apresentações vi que a maioria possuía apenas rostos diferentes, as histórias, volta e meia, se repetiam. Um gastrônomo, um analista de sistemas, um advogado, um marxista. No mais, gente como eu: docentes, educadores, pessoas preocupadas em promover uma educação de qualidade.

Havia também mosquitos, pernilongos, muriçocas, borrachudos. Muitos, um “batalhão” deles e, como disse minha companheira de “sonhos”, mais pareciam bois com asas que pastavam nosso sangue.

Nunca 4 horas passaram tão depressa. Tantas informações; meus dedos não acompanhavam meus pensamentos, muito menos os pensamentos e palavras do professor. Este, um português de olhos azuis de ressaca (sei que Machado ressacou olhos castanhos, mas os do meu professor são azuis). Ressacada também era sua voz, lenta e arrastada que, em consonância com o forte sotaque da língua mãe, fez-me perder 80% do que ele falava nos dois primeiros quartos da aula.

No meio das anotações o gravite da minha lapiseira acabou e, quando eu o repunha, minha mente lembrou-me de quando eu comprei a lapiseira, no início do ano, junto com o material escolar do meu bebê, quando disse a ela: “vou comprar uma lapiseira vermelha e bonita para fazer diversas anotações no Mestrado”.

Naquele momento, ali na papelaria, era apenas um sonho, hoje é real! É certo que tive que fazer algumas adaptações, mas e daí, não sou nenhuma roteirista mesmo, apenas tenho as idéias, elaboro o plano, traço as metas e o Criador, Ele sim, o maior roteirista de minha vida, dá conta de colocar as coisas para andarem e acontecerem, ou seja, por os sonhos em prática.

Prática, tudo é uma questão de prática. No quarto quarto da aula, já perdia apenas 40% do que o professor português com olhos de ressaca falava. Até domingo darei um jeito de adaptar-me melhor para perder apenas os 5% permitidos a uma mente altamente imaginativa de viajar dentro de si mesma para outros mundos que só a ela pertencem.

PS: Não participei do Módulo I, por isso esse diário inicia-se do Módulo II.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

EU E O DESTINO

Eu ousei mudar meu Destino. Ele, o Destino, foi desenhado para mim quando ainda não respirava o ar impuro deste mundo. Entretanto, quando o olhei, analisei e medi as possibilidades que ele me oferecia, não gostei delas e ousei mudá-lo.

Confesso que não foi fácil. O Destino insistiu em perseguir-me. Quando conseguiu alcançar-me, prendeu-me, açoitou-me, atou-me e escravizou-me. Fiquei ali, então, acuada e oprimida tendo que viver apenas o que ele traçara para mim. Mas, como no “mito da caverna”, via as sobras lá de fora, projetadas no fundo da caverna e não contentava com a escuridão à minha frente.

Meticulosamente fui aprendendo a conhecer melhor o meu Destino. Ele, o Destino, não era muito articulado e não gostava de falar de si, mostrar do que gostava, do que odiava, explicitar seus pontos fortes e/ou fracos. Com muito jeitinho, mostrando-me sempre interessada por si, fui falando de mim, mostrando-me a ele e, aos poucos conquistamos a confiança um do outro.

Nesta interação entre eu e meu Destino, percebi sua sabedoria, sua força e seu poder sobre mim e compreendi que não conseguiria simplesmente fugir de suas garras novamente.

Com delicadeza, procurei mostrar-lhe que não estava satisfeita com a realidade que desenhara para mim. Fato após fato, fui apresentando ao Destino o que me desagradava, onde poderíamos mudar e ele, sempre muito atencioso pareceu compreender-me, compreender minha angústia e meu dissabor com minha vida e, inesperadamente, fez-me uma proposta: O Destino, senhor de todas as histórias, propôs-me realizar as tais mudanças que sugeri, mas, em contra partida, mesmo que me arrependesse, não poderia mais voltar atrás, deveria assumir todas as responsabilidades pelos sabores e dissabores dessa mudança.

Topei, disse sim! 

Vagarosamente coloquei-me de frente para a “entrada da caverna”. Vislumbrei a luz ofuscante do sol e seu calor que aquece; senti o cheiro da brisa que tocava minha pele; ouvi o cantar dos pássaros e outros sons que povoavam o ambiente. Fui reconstruindo minha vida, assim como achava que deveria ser, mudando, aqui e ali, alguns pontos com os quais não concordava com o Destino.

Algum tempo já se passou desde que aceitei a proposta do Destino. Ainda não sei o que ele quis dizer com “assumir toda a responsabilidade pelos sabores e dissabores dessa mudança”, mas a passadas miúdas pela relva da minha nova vida, já compreendi que sim, “às vezes, os ventos erram a direção”.

domingo, 21 de novembro de 2010

SOBRE A VIDA E O VIVER


Sempre tive em mim que as histórias se repetem. Não estou falando no coletivo, ou de gerações, estou falando no individual, no pessoal mesmo. 

Outro dia estava conversando com uma moça e ela me contou da dificuldade que é sua vida: perdeu a mãe ainda criança, viveu de casa em casa de parentes até casar e, quando imaginava que a vida dar-lhe-ia um ‘descanso’, o marido adoeceu e ela teve que assumir todas as responsabilidades com casa, filhos, marido, gato, cachorro, papagaio e periquito.

Fiquei observando ela contar sua história e pensando: “quantas outras já ouvi neste mesmo ritmo? Quantas vezes a ‘sorte’ das pessoas é traçada quando nascem e, independente do caminho que elas decidam trilhar, nada vai mudar?”...

Não sei como categorizar esse meu pensamento, esse meu divagar, só sei que isso é algo que venho pensando já há algum tempo. O cenário muda, os atores também, mas o enredo é sempre o mesmo.

Perdas e ganhos fazem parte da nossa vida. Sei disso. O que quero ‘tentar’ dizer é que se estamos cadastrados no caminho das perdas, dificilmente (ali, bem perto do impossível), conseguiremos trilhar o caminho dos ganhos. 

Dentre muitas coisas, essa é uma daquelas em que quero muito estar errada. Quero que a vida me prove meu erro de julgamento a seu respeito. Mas para isso preciso viver. Então, vamos nessa.

terça-feira, 16 de novembro de 2010

REENCONTRO


Caminhava pela praia vagarosamente. Sentia seus pés tocarem o chão quente e ouvia os estalidos dos pequeninos grãos de areia. Uma brisa suave tocava seu rosto e o barulho das ondas enchia toda aquela imensidão, não havendo espaço para mais nada em seus ouvidos.

Havia muito tempo que estivera ali. Eram outros momentos, outros ruídos, alguns rostos, sorrisos, brincadeiras de criança. Agora era apenas ela, o mar, o sol e a imensa faixa de areia branca e quente.

Enquanto caminhava, observava o desenhar dos seus passos na areia, um após o outro, iam deixando uma trilha marcando sua direção. De súbito olhou para frente e percebeu que um vulto aproximava-se. Apertou os olhos com que para forçar a visão e, aos poucos, o vulto foi tomando corpo, forma, feição.

Seu coração deu um salto descompassado ao reconhecer a pessoa que vinha a seu encontro. Não se lembrava mais a última vez que haviam encontrado-se; mal podia lembrar de seu rosto, mas quando ela aproximou-se mais teve a certeza de que nunca se afastaram o suficiente para esquecerem uma da outra.

Num primeiro momento trocaram um olhar desconfiado, mas aos poucos estenderam os braços e um abraço apertado foi trocado ali, naquela praia deserta, onde apenas o mar e o céu serviam-lhe de testemunha.

Como crianças correram pela faixa de areia. Iam até o mar, molhavam os pés e saiam correndo das ondas, como que numa brincadeira de pega-pega. Já cansadas e sem fôlego, sentaram-se na beirinha da praia. Sem pedir licença, ou proferir uma só palavra, a primeira aninhou-se no colo da segunda e ficou ali, ouvindo o bater do seu coração que parecia uma belíssima canção de ninar acompanhada pelo barulho das ondas.

O sol já ia se pondo lá longe e ambas perceberam que era chegada a hora de se afastarem novamente. Uma lágrima correu o rosto da primeira. Ela não queria deixá-la novamente, não tinha se dado conta de quanto sentia falta daquele contato, daquela sabedoria, bondade e carinho. Como que compreendendo o que a primeira sentia em seu peito, a segunda acenou com a cabeça transmitindo-lhe que não mais se separariam e, mais que isso, jamais a abandonara, estivera sempre ali, em silêncio, aguardando-a retornar de sua longa, triste e penosa jornada.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

PAISAGEM CULTURAL


Afonso Cláudio tem quase 120 anos de emancipação política, fora os tantos outros anos que os desbravadores desta terra lindíssima por aqui viveram sem que se marcassem o tempo. 120 anos é uma vida. E quantas histórias? Entretanto, se as histórias não forem contadas, elas acabam sendo esquecidas, principalmente aquelas que não são escritas em papel e sobrevivem nas crenças de seu povo, no seu comportamento, nas suas regras morais, nos seus costumes e, por que não, nas fachadas de suas construções que são as paisagens culturais de uma cidade?

Nasci e cresci nessa cidade. Aprendi a gostar dela mais do que qualquer outra. Gosto de seu aparente sossego, sua beleza bucólica, sua estranheza com o que não lhe pertence, ao mesmo tempo em que abraça o estrangeiro que por aqui aporta e o faz sentir-se em casa. Gosto de acordar pela manhã e ouvir os pássaros cantando do lado de fora. Gosto de olhar para o céu à noite e ver milhões de estrelas sem que as luzes das ruas atrapalhem. Gosto de receber bom dia de pessoas que não conheço, mas que sabem de quem sou filha ou neta.

Contudo, há algo que me incomoda por aqui. Por mais que me esforce, busque, pesquise, cavuque fósseis de um tempo nem tão remoto assim, percebo que Afonso Cláudio tem uma história pobre. Não pobre de acontecimentos, porque esses foram inúmeros, incontáveis e ricos em detalhes pitorescos daqueles que só acontecem por aqui, mas pobre em memória, em registros. São poucos os documentos escritos que mostram a nossa história. Os costumes, as crenças e os valores que também formam a nossa cultura; esses estão se perdendo a cada geração que renova a vida da cidade. O que resta, pouco ou nada é divulgado aos jovens que crescem sem saber a grandiosidade da narrativa do solo em que pisam.

Há algum tempo ouvi dizer que demoliriam o Hotel Custódio e construiriam ali um luxuoso e moderno prédio. A princípio não me dei conta do que isso significava, mas quando vi o espaço vazio na esquina da Praça Aderbal Galvão, tive a certeza de que mais um pedaço da nossa história, nossa cultura construída com pedras, massa e tijolos, estava sendo destruída.

Movida pela melancolia daquele espaço vazio, vaguei pela cidade em busca de outras edificações que contassem um pouco dos nossos 119 anos de história e, tristemente constatei que pouquíssimas ainda resistem às construções modernas. Nossa história tão pobre em relatos escritos está a cada dia ficando ainda mais pobre em paisagem cultural.

Não levanto aqui uma bandeira contra a modernização de Afonso Cláudio, quero apenas que repensemos a preservação de nosso patrimônio cultural em todos os âmbitos que ele se apresenta, cientes de que um povo sem história é um povo mais pobre culturalmente e que para construir o futuro não precisamos, necessariamente, destruir o passado, muito pelo contrário, precisamos preservá-lo e recontá-lo às gerações vindouras para que elas valorizem o esforço que fazemos para construir esta terra que lhes é berço, progenitora e celeiro de grandes mentes, obras e histórias, cujas raízes alicerçam muitas lidas, lutas e vitórias.