domingo, 21 de setembro de 2014

PRIMAVERA

Ando revisitando meu passado ultimamente. Não, não é saudosismo ou melancolia; sou só eu mesma querendo descobrir onde parei de sonhar e passei a apenas viver. Não estou querendo dizer que quem vive não sonha, mas quem sonha vive diferente, vive numa busca, vive numa esperança, vive numa alegria leve, vive com o pé no hoje e o olhar no amanhã, sem pressa.
Já quem apenas vive e deixou, ou esqueceu como se sonha, apenas vive, dia após dia. Meio que mecanicamente, meio que no controle remoto: acorda, confere a agenda, cumpre os combinados, faz uma social, sorri, chora e dorme novamente.
Hoje fiz algo que há muito não fazia. Mexi na terra, arranquei algumas ervas daninhas. Plantei mudas velhas em vasos novos, plantei mudas novas em vasos velhos. Acheguei terra em algumas árvores já sem forças para buscar alimento mais lá no fundo.
Também dei uma atenção especial à minha arvorezinha da felicidade. Ela já foi uma planta forte, cheia de galhos e folhas. Verdinha de dar gosto. Há pouco tempo quase morreu. Todas as folhas amarelaram, murcharam e caíram. Achei que a tinha perdido para sempre. Outro dia percebi que alguém tinha colocado seu vaso em outro local e ela estava começando a brotar novamente. Replantei -a num vaso bem maior. Ajeitei-a com carinho e coloquei terra nova, bastante esterco. Coloquei-a num lugar de destaque no meu jardim. Agora é prioridade revivê-la.
A primavera está chegando, faltam só mais alguns dias. E com ela vem também o momento do desabrochar, do renascer.

Que esta primavera seja cheia de novas flores, novos amores. Que as cores e o arco-íris sejam presença constante todos os dias. E que eu redescubra a arte de não apenas viver, mas também de sonhar.

sexta-feira, 18 de abril de 2014

FAMÍLIA


Eu estava numa cama de hospital. Minhas filhas estavam comigo, junto com as filhas delas e os pais das filhas delas. Todos sorriam, inclusive eu. Sentia-me cansada, mas não sentia nenhuma dor, ou angústia, ou medo. Não sei que idade tinha, mas pelo que via das minhas meninas crescidas, mulheres feitas, eu tinha mais de 60; 70 talvez...

Minha filha caçula estava sentada aos meus pés com as pernas dobradas e tocava no violão uma música suave e feliz. Minhas netas riam e cantarolavam. Podia-se sentir o amor presente. Por um instante pensei ver ao fundo do quarto os que me precederam na morte: minha mãe, meu pai, meu irmão, uma tia que não lembro o nome, uma amiga... todos sorriam para mim, sorriso de aprovação.

Consegui vislumbrar a Minha Família. Todos ali ao meu redor, felizes com a minha presença, fazendo-me feliz com a sua presença. Vagarosamente fui fechando meus olhos, uma onda inexplicável de prazer tomava conta de mim. Adormeci o sono mais tranqüilo de toda uma vida. Silêncio absoluto. Paz profunda.

Ao longe ouvi uma voz suave me chamando: “Mamãe, mamãe, acorde, o médico chegou para dar sua alta. Vamos para casa!”