domingo, 30 de janeiro de 2011

A MULHER DO ARROZ


Estávamos sentadas numa mesa no calçadão, esperando nossa pizza, quando ela apareceu. Uma moça simples, cabelos trançados na altura da cintura, roupas surradas no estilo hippie, voz mansa e tranqüila, assim como seu semblante e, com muita educação, nos ofereceu seu produto: um cordão preto que segurava um minúsculo tubo de vidro cheio de água onde boiava um caroço de arroz com um nome escrito em tinta preta. Apenas isso e a promessa de escrever qualquer nome que quiséssemos, até dois, num único caroço de arroz, pela bagatela de R$ 5,00.

Achamos interessante, mas recusamos. Afinal estávamos chegando ao balneário, era ainda o primeiro dia, e não pensávamos em lembranças. Na verdade, ainda nem pensávamos no retorno. Queríamos apenas curtir, rir, brincar, descansar e conhecer gente. E quanta gente aquele lugar oferecia. Gentes de todos os tipos, jeitos, tamanhos e cores (se bem que a cor predominante era o vermelho e seus matizes).

Todas as manhãs, tardes e noites, quando caminhávamos pela orla, deparávamos com uma infinidade de gente. Como boa observadora, seus trejeitos eram o que mais me encantava. Ficava ali, entretida entre olhar as ondas que iam e vinham e as gentes que também iam e vinham. Admirava-me com a diversidade de gente que o mundo oferece, e ao mesmo tempo basta você encontrar uma que encaixe com você para que seja “feliz para sempre”.

Nesta multidão de gente, vi os que olhavam extasiados para aquela imensidão de água a sua frente e sentiam medo; via as gentes pequenas que se divertiam mais que as gentes grandes, pelo simples fato de que naquele espaço não existiam grades, muros ou qualquer limitação de suas aventuras; vi gente cuidando da saúde correndo de lá para cá; vi gente exibindo a saúde (ou falta dela) também correndo de lá para cá; vi gente tostanto ao calor do sol ignorando todas as dicas médicas de saúde e de bom senso.

Vi gente que estava ali só para dar um tempo na realidade da vida; vi gente que estava ali encarando a realidade da vida; vi gente empurrando carrinho na areia fofa ou carregando pesos astronômicos nas costas surradas pelo sol.

Vi gente, muitas gentes e o mais interessante é que as gentes se renovam a cada dia, ou seja, a gente que você via num dia, você não via mais no outro dia, assim como a mulher do arroz.
Quando estávamos nos últimos dias de férias, concluímos que um grão de arroz com o nome escrito de tinta preta, boiando num minúsculo tubo com água atado a um cordão preto era uma boa lembrança para as gentes que amamos e que ficaram em casa. Desta forma, nos pusemos a procurar a mulher do arroz.

Andamos dois, três dias a sua procura. Exaustos, alguém cogitou a possibilidade de tê-la visto em algum ponto do calçadão escrevendo no arroz e lá fomos nós procurá-la e nada. Outro dia, num lual, outra das nossas gentes achou que fosse ela por lá também, mas era apenas outra mulher, não a do arroz.


E foi assim, que viemos embora sem o arroz com o nome escrito de tinta preta, boiando num minúsculo tubo com água atado a um cordão preto, mas com muitas gentes novas na cabeça devido a infinidade com a qual nos deparamos naquele lugar;  deixando a certeza de que no mundo há mesmo muita gente e coisa para ser vista, ouvida e sobretudo sentida. E, por mais conscientes que sejamos, não sabemos uma ninharia ou conhecemos muito pouco do que é a vida e o viver, e nada como uma voltinha fora do nosso mundinho para termos consciência disso.
Já na estrada, de volta para casa, uma de nossas gentes, que havia ficado na rodoviária para ir para outro lugar, nos manda uma mensagem via celular dizendo o seguinte: “Você não vai acreditar, a mulher do arroz acaba de entrar no meu ônibus”.

É, algumas vezes as gentes reaparecem, mas em outros contextos, ambientes e momentos. Coisas da vida.

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

REFLEXÕES


(Foto Claudiana Eduarda Lerbarch)
Esta época do ano é dada a reflexões. Uns fazem balanços do que passou, outros fazem planos do que há por vir e há ainda aqueles que passam despercebidos por esse momento e apenas vão vivendo um dia após o outro, sem se dar conta do momento e das alterações que uma simples mudança de calendário pode causar.

Não vivo no passado nem “do” passado, mas também não chego ao extremo de dizer que “quem vive de passado é museu”. Revisito meu passado sempre que necessário, sempre em busca de situações que me proporcionem algum ensinamento adicional, alguma informação que me auxilie a entender atitudes e acontecimentos atuais ou simplesmente para reviver um sentimento gostoso que ficou lá guardado.

Nesta dicotomia de revisitar ou reviver o passado, também realizei minhas reflexões e balanços de fim/início de ano. Nelas constatei coisas que deram errado, analisei atividades inconsistentes que não me levaram a lugar algum, pontuei atitudes que me fizeram sorrir, destaquei outras que fizeram fluir lágrimas. Tive a oportunidade também de refletir sobre relações que me acrescentaram como pessoa, outras que me diminuíram como indivíduo e ainda aquelas que, de tão vazias, vagaram bem próximas ao esquecimento.

Diante das minhas reflexões e análises, optei por ser mais cautelosa, de agora em diante, em todos os meus atos; sejam eles pessoais, profissionais e especialmente espirituais. Procurarei pensar mais e falar menos, ser mais criteriosa em relação às minhas escolhas e, de alguma forma, ser feliz o máximo de momentos que a própria felicidade permitir. Procurarei também correr atrás apenas do que me faz bem, eliminar da minha vida o que me destrói e absorver todo prazer possível em tudo o que eu fizer, mesmo naquelas coisas que faço por obrigação.

Em todas essas reflexões, algo realmente compreendi: uma das principais características do passado é que ele não se torna futuro, nem tão pouco presente. Então, viva o hoje, seja feliz agora! Programe-se o mínimo possível, o suficiente apenas para estabelecer parâmetros que facilitem a caminhada e, assim, poderá revisitar o passado sempre que quiser ou achar necessário para com ele aprender e dele se deliciar; como no cinema, quando nos deparamos com um filme bem escrito, bem produzido, bem escalado e que no final da sessão sai aclamado por público e crítica.