Eu estava numa cama de hospital. Minhas filhas estavam
comigo, junto com as filhas delas e os pais das filhas delas. Todos sorriam,
inclusive eu. Sentia-me cansada, mas não sentia nenhuma dor, ou angústia, ou
medo. Não sei que idade tinha, mas pelo que via das minhas meninas crescidas,
mulheres feitas, eu tinha mais de 60; 70 talvez...
Minha filha caçula estava sentada aos meus pés com as
pernas dobradas e tocava no violão uma música suave e feliz. Minhas netas riam
e cantarolavam. Podia-se sentir o amor presente. Por um instante pensei ver ao
fundo do quarto os que me precederam na morte: minha mãe, meu pai, meu irmão,
uma tia que não lembro o nome, uma amiga... todos sorriam para mim, sorriso de
aprovação.
Consegui vislumbrar a Minha Família. Todos ali ao meu
redor, felizes com a minha presença, fazendo-me feliz com a sua presença.
Vagarosamente fui fechando meus olhos, uma onda inexplicável de prazer tomava
conta de mim. Adormeci o sono mais tranqüilo de toda uma vida. Silêncio
absoluto. Paz profunda.
Ao longe ouvi uma voz suave me chamando: “Mamãe, mamãe,
acorde, o médico chegou para dar sua alta. Vamos para casa!”